Por Arthur Virgílio*
Nunca foi tão grande a distância entre sociedade e política. Nunca os políticos estiveram tão desmoralizados aos olhos do povo.
Há razões para isso: escândalos, incompetência, descaso. A prosseguir assim, a democracia se enfraquecerá e poderá surgir alguma figura estilo “salvador da pátria”, com o perigo de arrastar o país para a aventura.
A maioria das pessoas despreza partidos, sindicatos, associações. Comunica-se pela internet e, dessa forma, as instituições tradicionais de representação perdem terreno a olhos vistos.
É o cansaço de tanta impunidade, de CPIs que não dão em nada, do conluio que forma, em paralelo à tradicional, fundada em 1889, a “república do rabo preso”. É o mundo das propinas, das fortunas que florescem inexplicavelmente da noite para o dia, das obras superfaturadas, intencionalmente mal feitas ou até fantasmas.
As fotos dos bacantes de Paris, encabeçados pelo governador fluminense, Sergio Cabral, são o retrato da situação patética em que vivemos: gastos exorbitantes, presença de empreiteiros e fornecedores do estado, a começar por Fernando Cavendish. Constrangedor.
Retrata uma época: a mancebia entre o público e o privado, guardanapos grotescamente transformados em chapéus, dancinhas ridículas, sorrisos aparvalhados, deslumbramento e falta de compostura. Infelizmente é a nossa época.
Além dos aspectos morais, vejo a questão da linguagem. Os jovens da internet, ricos ou frequentadores de lan houses da periferia, não têm motivo para escutar mensagens de políticos fechados para as vozes de fora do seu mundo canhestro.
Não percebem que as redes sociais possibilitam a reunião de pessoas que, mesmo não se conhecendo pessoalmente, descobrem afinidades e passam a interagir sobre a realidade. Crescem, inclusive politicamente, à margem de práticas que não as sensibilizam ou mobilizam.
A “Primavera Árabe” mostrou isso. Foi a comunicação pelas mídias sociais a destronar tiranos instalados há décadas no poder sustentado pela força e pelo suborno. Não estou seguro de que esses países rumarão todos na direção da democracia. Registro apenas que cidadãos, com prevalência de jovens, derrubaram ditadores passando ao largo de partidos, sindicatos e entidades afins.
Evidente que se pode atingir objetivos ousados, utilizando as ferramentas contemporâneas de comunicação. Mas não se governa um país sem organização política eficaz, sem quadros capazes da boa gerência, sem expertise.
Aí está o divórcio. Os que desejam uma sociedade justa e digna não se entendem com representantes que não se mostram à altura do desafio proposto.
Não pode ser assim para sempre e quem precisa mudar, o quanto antes, é a política carcomida.
*Diplomata, foi líder do PSDB no Senado.