Por Fernando Dueire
O genial Charles Chaplin repetia que “a única coisa tão inevitável quanto à morte é a vida”. E por falar em vida, há de festejarmos muitos exemplos virtuosos, pessoas que nos passam essências de espiritualidade, brilho e resiliência mesmo diante de duras adversidades. Em outro curso, encontramos almas amarguradas, perdidas nas encruzilhadas de suas próprias sombras.
Isso posto, cabe em momento de tanto desassossego algumas reflexões. A vida? O que nos pede? O que dela entendemos? O que queremos fazer com ela?
De forma preliminar e ao mesmo tempo definitiva, pelo menos para mim, ela precisa ser compreendida como uma concessão provisória, transitória, efêmera, passageira. Essa é a única certeza material que temos, as outras estão no campo da esperança e espiritualidade.
O fato é que no decorrer da história, em uma retrospectiva dos últimos 100 anos, duros episódios de desastres humanitários provocados pelo próprio homem devastaram imensas regiões do planeta; duas grandes guerras mundiais com aproximadamente 85 milhões de mortes, a impiedosa pandemia da gripe espanhola com cerca de 50 milhões de óbitos, a grande depressão em 1929, conflitos duradouros e fratricidas como os da Coreia e Vietnã, entre outros, o que resultou em uma profusão inaceitável de baixas.
No curso desse longo tempo, refugiados de diferentes etnias, ainda hoje, passam humilhações e sacrifícios na busca de um acolhimento em países que não são os seus. Vivem como beduínos ao desalento em rotas perdidas. E ainda assim tem resistido à humanidade, teimosa em acertar o passo que joga ao vento logo em seguida aos sinistros provocados.
Hoje vivemos a pandemia do novo coronavírus, devastadora doença que aniquila milhões de pessoas em todos os continentes, sem obedecer faixas de renda ou idade. Um verdadeiro salto no escuro para a ciência, agravada pela limitada capacidade hospitalar instalada. Tudo isso em meio a tantos desafios, carcaças de construções inconclusas ou desacertadas, em desvios, curvas e retas do que deveria ser um mesmo caminho.
E o Brasil nisso, limpo e deformado, sujo e maltratado, injusto em uma mordaça de desigualdades abissais.
Outro dia, em brilhante texto de Pedro Malan, identifiquei uma verdade universal bem aplicável a este país: “O homem sábio ajusta suas crenças às evidências”. Essa assertiva tão fácil e complicada de ser entendida anda vagando sem rumo por aqui.
No artigo, ele alerta para o futuro com a proximidade da exaustão de nosso bônus demográfico, visto que a população em idade ativa cresce a uma taxa menor que a de crianças e idosos, e sentencia, “somos um país que corre sério risco de ficar velho antes de superar a armadilha da renda média.” Isso precisa ser melhor entendido e avaliado.
O Covid-19 termina por impor aos nossos governos respostas em três grandes áreas ; infraestrutura física, maior solidez em capital humano, atitudes com relação a pobreza, distribuição de renda e oportunidades. A resposta a tantos desafios estará na arte das escolhas e na capacidade de vê-las efetivas.
Finalmente, como no início desse texto, e na corrente de João Cabral, repito o verso; “a melhor medida do homem não é a morte, é a vida…”. Vida digna, sem essa colossal desigualdade, patologia social permissiva que já faz parte de uma paisagem que desdenha em ficar ao olhar passivo da ineficiente estrutura do estado brasileiro.
Fernando Dueire é economista
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