Uma usina de crises
Desde a redemocratização o Brasil teve oito presidentes em pouco mais de trinta anos, mesmo três deles sendo reeleitos como Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff. Em três oportunidades o vice-presidente acabou sendo alçado ao posto, como José Sarney em substituição a Tancredo Neves, após o seu falecimento, Itamar Franco no lugar de Fernando Collor após este sofrer impeachment e agora Michel Temer substitui Dilma Rousseff após o impeachment.
Todos os presidentes enfrentaram problemas de ordem de corrupção, de ordem econômica, etc. De Sarney a Fernando Henrique, todos tiveram problemas com a hiperinflação, os planos econômicos do governo Sarney e do governo Collor foram verdadeiros fiascos até Fernando Henrique viabilizar o Plano Real ainda no governo Itamar Franco, com a derrota da inflação, o país apostou em FHC que foi presidente por oito anos.
No caso da emenda da reeleição em 1997 há uma série de acusações de que houve compra de votos para a PEC ser aprovada no Congresso Nacional ainda no primeiro governo FHC. No governo Lula em 2004, pouco tempo depois de assumir o mandato, estourou o Mensalão que consistia na compra de votos do Congresso Nacional para aprovar projetos de interesse do governo. Essa prática não cessou e durante o governo Dilma as crises continuaram e culminaram no seu afastamento por uma série de fatores que inviabilizaram a governabilidade.
O presidente Michel Temer, que está prestes a completar um mês no cargo, continua enfrentando crises políticas de ordem ética que travam o seu governo como as denúncias de tentativa de obstrução à Operação Lava-Jato por figurões do seu partido, o PMDB, como Renan Calheiros, José Sarney e Romero Jucá, bem como o presidente afastado da Câmara Eduardo Cunha que possui uma série de esqueletos no armário.
Todas as crises que colocaram na berlinda os governos de FHC, Lula, Dilma, e agora Temer, tiveram uma única matriz: o sistema político e eleitoral brasileiro. Políticos fazem de tudo para chegar ao poder e ampliam o leque de opções nada republicanas para se manter nele. Uma campanha eleitoral tem custos astronômicos, e vai do mais simples vereador ao presidente da República. O valor arrecadado para o “projeto” é fruto de doações de empresas que não têm qualquer viés ideológico e sim uma mera aposta em vários atores políticos a fim de comprar a representatividade, seja na mais simplória Câmara Municipal até chegar ao Senado Federal ou ao cargo maior da República: o de presidente.
O sistema eleitoral, não o do voto proporcional que foi instituído no Brasil, mas sim a forma com que os políticos conseguem se eleger, é extremamente danoso ao país. É um negócio como outro qualquer, onde ganha quem faz aportes financeiros significativos para montar uma engrenagem bastante complexa que permite ao candidato rico chegar ao cargo de representante do povo. Uma vez eleito, o político não tem qualquer compromisso com o eleitor porque geralmente o eleitor que lhe deu o voto apenas o fez porque recebeu algum benefício direto ou indireto para poder digitar o número na urna.
Isso cria uma série de representantes sem compromisso algum com os representados, e quando chegam ao cargo precisam participar de esquemas para continuar no mandato, pois apenas o salário e as verbas oficiais são uma gota d’água no oceano, porém eles não querem deixar os respectivos cargos porque acreditam que se perderem o mandato de vereador, deputado estadual, deputado federal ou senador, estarão aniquilados e desmoralizados. Naturalmente jogam para se manter. Os governos, que dependem do poder legislativo para governar, precisam a cada votação construir uma maioria nas casas legislativas, e isso se torna extremamente danoso ao país.
Do jeito que está pode até colocar Jesus Cristo na presidência da República que não conseguirá dar jeito, pois a nossa política e o nosso presidencialismo de coalizão se tornaram uma usina de crises que só poderá ter mudanças não com novas eleições, mas sim com uma ampla e irrestrita reforma política com plena participação da sociedade, que mais do que nunca precisa aprender o valor do voto para o presente e principalmente o futuro do nosso país.
Equívoco – Na nossa coluna de ontem afirmamos que o ex-deputado João Paulo poderia tentar um mandato de vereador do Recife pelo PT em vez de ser candidato a prefeito, porém essa hipótese é legalmente impossível de ocorrer, uma vez que João Paulo estava presidindo a Sudene até meados de maio, quando para ser candidato a vereador teria que se desincompatibilizar do cargo no início de abril.
Arquivado – O presidente do Conselho de Ética do Senado João Alberto Souza (PMDB/MA) mandou arquivar o processo que pedia a cassação do mandato do senador Romero Jucá (PMDB/RR) por falta de provas. Curiosamente Jucá teve o seu pedido de prisão solicitado pelo procurador Geral da República Rodrigo Janot por tentativa de obstrução à Lava-Jato.
Surubim – O secretário de Agricultura Nilton Mota desistiu de ser candidato a prefeito de Surubim e por isso não se desincompatibilizou do cargo no início deste mês. Nilton decidiu apoiar a candidatura de Ana Célia Farias a prefeita tendo como vice-prefeito Guilherme Nóbrega. A decisão de Nilton frustrou alguns suplentes de deputado estadual que estavam torcendo pela sua candidatura e consequente vitória para herdarem seu mandato em definitivo na Alepe.
Veto – O presidente Michel Temer vetou ontem as medidas que aumentavam os salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que geraria um efeito cascata causando a quebradeira generalizada dos estados, e a criação de 14 mil cargos. Temer avaliou que se aprovasse estas medidas estaria indo frontalmente aos anseios da sociedade, que enfrenta uma das maiores crises econômicas da história do país desde a implantação do Plano Real.
RÁPIDAS
Renúncia – O líder do governo no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), renunciou ontem à sua vaga de titular na Comissão Especial do Impeachment. O tucano tomou a decisão depois de ter sido escolhido para a liderança do governo na Casa por considerar que é inviável acumular as duas funções pelo excesso de trabalho.
Julgamento – O Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco julga hoje um recurso impetrado por Luciana Santos em 2009 contra a rejeição, por unanimidade, das suas contas de 2002 na prefeitura de Olinda. Se o pleno do TCE mantiver a decisão, Luciana poderá ficar inelegível e consequentemente estará fora da disputa pela prefeitura de Olinda em outubro.
Inocente quer saber – Por quê Rodrigo Janot não solicitou a prisão de Lula junto com a de Renan, Cunha, Sarney e Jucá?