Da Folha de S.Paulo – Natuza Nery
A decisão de não participar do anúncio do corte nas despesas do governo nesta sexta-feira (22) despertou em integrantes do governo o receio de que o ministro Joaquim Levy termine por jogar a toalha e deixe a Fazenda.
Na versão oficial, uma gripe tirou Levy do evento mais importante desde que tomou posse na Esplanada.
Na extra-oficial, ele quis marcar posição sobre suas divergências em relação ao tom do ajuste e do cenário fiscal, que ele reputa como bem mais “sombrio” do que aquele que foi apresentado pelo governo Dilma.
Sua ausência evidenciou a insatisfação do ministro e alimentou rumores de uma eventual despedida. Tanto que, na sexta, ao deixar o ministério, fez questão de dar uma mensagem aos jornalistas: “volto novo na segunda”. Foi um recado desenhado especialmente para desmobilizar insinuações de demissão.
No Planalto, uma possível saída do chefe da equipe econômica, sobretudo no atual cenário de dificuldade financeira e política, é vista como desastrosa. Mas ministros de Dilma reconhecem que as perspectivas não são boas.
Alguns auxiliares presidenciais relataram as razões da insatisfação de Levy.
Em relação ao corte no Orçamento, ele defendia que os parâmetros do contingenciamento fossem mais duros, assim como a mensagem geral sobre a situação da economia.
Ele, por exemplo, já havia mencionado em reuniões internas que a estimativa de receita para este ano, de R$ 1,158 trilhão, está superestimada, mas esse foi o número adotado como oficial.
O ministro chegou ao governo divulgando que adotaria o chamado “realismo fiscal” para retomar a credibilidade com o mercado –reavaliações constantes de números oficiais enfraquecem esse objetivo.
A preocupação também recai sobre as medidas do ajuste em tramitação no Congresso. Com o governo fraco para fazer valer sua versão nos textos das medidas, deputados e senadores andam aprovando emendas que desvirtuam o sentido inicial dos projetos: fechar os dutos por onde saem recursos públicos.
Na semana passada, o ministério chegou a sugerir que o Planalto abandonasse a MP 664, medida que impõe regras mais duras para concessão de benefícios como pensão por morte e auxílio-doença, em nome da manutenção do chamado fator previdenciário nos moldes atuais.
A Câmara mexeu nas regras do fator previdenciário à revelia da área econômica. Com as mudanças no mecanismo, o regime de previdência em menos de uma década ficaria insustentável.
A regra aprovada pelos deputados, chamada de fórmula 85/95, permite a aposentadoria integral, sem o corte do fator previdenciário, sempre que a soma da idade com o tempo de contribuição do segurado der 85, para mulheres, ou 95, para homens.
Na semana passada, Levy passou por outra frustração. Pediu que a medida provisória que aumentou de 15% para 20% a taxação dos bancos via CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) fosse editada um pouco mais para frente. Queria ter mais tempo para dialogar com o setor financeiro e evitar uma taxação surpresa.
Mas a presidente Dilma e o ministro Alozio Mercadante (Casa Civil) foram contra. A MP foi publicada no “Diário Oficial” de sexta, dia do anúncio do corte.